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Samosas em boa companhia!

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Completando mais um mês de casados (o 5º de muitos vindouros!), decidimos sair para comemorar e jantarmos em algum lugar diferente. Entre várias sugestões que eu havia pensando, a Cá se saiu com uma ótima idéia: por que não ir em um restaurante indiano? Temos uma certa fascinação pelas especiarias, receitas diferentes, aromas e visuais da culinária do país das vacas sagradas, ainda mais após uma viagem para as ilhas Maurício, segunda maior comunidade hindu após a Índia, de onde trouxemos quilos e quilos de temperos nas malas.
Nossa primeira opção era o já conhecido Tandoori, de ótimas experiências anteriores e fácil localização para nós, sãobernardenses, mas, pesquisando um pouco, chegamos ao Samosa & Company, mais próximo ainda de casa, mais intimista e tradicional. Os proprietários, Vijay Bavaskar e sua esposa (e chef) Deepali Bavaskar fazem da pequena casa com indumentárias orientais e mesas simples uma grande surpresa.

As famosas Samosas!
Ao chegarmos, o pequeno salão estava lotado, o que nos levou a sentar em uma mesa do lado externo do restaurante (no pequeno pátio próximo à calçada, o que é uma ótima opção para os dias de calor intenso, que era o caso). Fomos atendidos pelo simpático e prestativo garçom, claramente estrangeiro (com pouca familiaridade com o português, mas mesmo assim ainda mais correto que muitas das obscenidades que ouvimos com a nossa língua causadas por operadores de telemarketing), que parecia estar revoltado com a mesa ao nosso lado (na qual havia um casal de indianos realmente estranho), e pedimos duas entradas para iniciar a noite: as famosas Samosas (que dão nome ao restaurante, afinal), e o Pickles de limão com especiarias (escrito dessa forma no cardápio). Nossas surpresas começaram com a Samosa, uma ótima combinação de uvas passas, ervilhas, batatas e especiarias em massa crocante e sequinha, acompanhada por dois chutneys sensacionais: tâmara e hortelã. A conserva de limão, com a fruta curtida por mais de um ano em uma mistura de temperos, é aromática e picante, vem no tamanho certo, pois tem um sabor predominantemente salgado que, se em excesso, estragaria seu paladar para o resto do jantar.
Butter Chicken, Navratan Korma, Arroz Basmati e Tawa Nan
Para os pratos principais, minha opção foi o vegetariano (para espanto da Cá) Navratan Korma, um prato de frutas grelhadas, legumes e castanhas com um aveludado molho de nozes e coco; as "nove jóias" (tradução para o nome do prato) ficam bem evidentes mesmo com o forte sabor do molho. Um curry pouco picante e deliciosamente agridoce. Já a Cá escolheu o Butter Chicken, prato muito popular na Índia, que consiste em um frango tenro cozido na manteiga coberto por um picante molho de tomate, porém sem ser forte; de paladar equilibrado, extremamente macio e aromático. Junto dos pratos, claro, o tradicional pão indiano (o Nan), em versão exclusiva do restaurante: o Tawa Nan, um quentinho e macio pão feito de farinha de trigo branca fermentada com iogurte. Ao trazer os pratos, a garçonete (essa sim, brasileira), comentou com um ar de empolgação: "vocês deram sorte, porque normalmente ela não faz as porções desse tamanho, sempre são menores, ela deve estar inspirada!" Ficamos sem palavras: independente de qualquer coisa, porque uma funcionária falaria isso do próprio restaurante?? Só rindo mesmo...
As sobremesas!
O enxuto cardápio lista apenas duas sobremesas: o Gulab Jamun, dois bolinhos de leite em pó embebidos em calda de água de rosas - gostosos, mas que de surpreendente só houve a surpresa que o garçom nos proporcionou: trouxe um bolinho extra e sorvete para acompanhar! A segunda sobremesa merece um capítulo à parte: o surpreendente Galar Halwa, um doce com amêndoas e sorvete que é feito de cenoura cozida! O desfecho ideal para um jantar de muitas surpresas!
Com a conta (que não trouxe nenhuma surpresa, e um gasto compatível com o que pedimos, nada absurdo, mas também nada baratinho), sentimos falta de apenas uma coisa: como um restaurante indiano, poderiam fazer o famoso café com chicória filtrado (sim, é comum na Índia e em regiões como Nova Orleans, nos EUA, utilizarem a raiz da chicória torrada e moída junto do café para intensificar o sabor dele).
O Samosa & Company abre de quarta à domingo, em dois horários: almoço (12 às 15h) e jantar (19 às 22h30). Vale a visita, e não se esqueça que, por se tratar de um restaurante indiano, não fazem absolutamente nada com carne bovina, sagrada e intocável para eles.

Madalena e o Jetta branco

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       O que um café em Santo André, uma cervejaria e um restaurante em São Bernardo tem em comum? Simples: os três não existem mais, assim como uma série de coisas muito boas, sem a grife de uma franquia (ou ser indicados pelo absolutamente "imparcial" júri da Veja ABC).
Na região em que vivemos, famosa pelas indústrias automotivas, metalúrgicas, sindicatos e um certo ex-presidente (que nunca saberemos se faz um joinha ou um hang loose....), o crescimento demográfico absurdo e o aumento da renda da população criou uma série de novas oportunidades de entretenimento, seja gastronômico ou não. Em menos de 5 anos, vários shoppings (com suas praças de alimentação pasteurizadas) foram reformados e /ou construídos, para serem aproveitados por cidadãos que residem em verdadeiros clubes em forma de condomínios.
Vendo este panorama, nada mais certo que apostar na criação de algo de alto nível (um lugar de alto nível não significa um restaurante caro e cheio de frescuras), para satisfazer este público, certo? Não. Infelizmente, no túmulo do samba conhecido como ABC Paulista, o status de ir à algum lugar da moda ainda é muito mais importante que a qualidade dos serviços prestados por este local.
Citei 3 exemplos no começo do texto, que podem ilustrar muito bem essa idéia. Comecemos pelo mais antigo: O Madame Tussaud Microcervejaria. Um bar simples, com ótimos pratos/petiscos e que tinha como grande diferencial a excelente cerveja produzida lá mesmo, pelas simpáticas proprietárias, que estavam anos-luz à frente destas cervejas "artesanais" que se tornaram famosas nos últimos tempos. Bem localizado, ao lado da mais badalada avenida de SBC (a Av. Kennedy), o Madame durou quase 10 anos, sempre vazio, com uma frequência assídua de pessoas (poucas) que se tornaram amigas das proprietárias, e que faziam a propaganda na base do boca-a-boca para os amigos, que iam conhecer o local e adoravam, mas não retornavam o tempo todo. Você pode falar que foi falta de divulgação; ok, falaremos sobre isso mais para a frente.
O segundo exemplo é um dos ótimos cafés que tivemos a oportunidade de conhecer: o Café Bandeiras.

Em um local nobre de Santo André, em uma travessa da rua mais badalada da cidade (a Rua das Figueiras), próximo ao restaurante que é venerado como o melhor restaurante da região – e também do mundo, da Via Láctea, da História e do bairro Jardim - pelo júri da Veja ABC (o enfadonho Baby Beef), com um cardápio enxuto, mas extremamente bem feito, o café durou pouquíssimo tempo, até ser vendido para um rapaz que, em associação com uma barista, o transformou no Royalle Café (que também durou pouco, e cedeu lugar para um pub bizarríssimo). Foi, nessa fase, inclusive indicado para a Veja ABC, apesar da pouca propaganda. Mais uma vez, pode se falar sobre a falta de divulgação.
Para finalizar os exemplos, o

mais recente e doloroso: o restaurante Madalena. O proprietário e chef Valter Pereira tinha uma proposta de comida contemporânea brasileira como poucos restaurantes no Brasil fazem: alta gastronomia, preços acessíveis e pratos muito bem servidos. Em um ponto mais escondido de SBC, mas nem por isso inacessível, o Madalena durou alguns anos com mais acertos que erros, até fechar as portas no fim do ano passado, por conta da queda de movimento. Falta de propaganda também, você pode argumentar.
O fato é que como contraponto disso tudo acima, os "pseudo-australianos" da vida (restaurantes de redes conhecidas, com preços altíssimos e filas idem) continuam absurdamente lotados, diariamente, em SP, por moradores do ABC, enquanto restaurantes melhores, localizados do outro lado da rua, ou na esquina de casa, sobrevivem às moscas. Casas como o Starbucks (nada contra, muito pelo contrário - e também não há propagandas deles) vivem cheias dentro de shoppings, enquanto cafés muito melhores, como o Bandeiras, fecham por falta de público. Quantos anúncios do The Fifties você viu na TV na sua vida? Então porque ele tem muito mais ocupação de mesas que a Sanduicheria Petrópolis em SBC, que é melhor e mais barata, e faz tanta propaganda quanto a lanchonete pseudo-americana dos anos 50? Porque não criar um ponto de referência em SBC para que o público de SP venha para cá, ao invés do contrário? Será a propaganda, ou a falta dela, a vilã da história? Não creio nisso.
Deslumbramento
Enquanto isso, o sãobernardense (e o andreense, e o sãocaetanense) emergente, sai com seu Jetta Branco (pela ótima definição do professor e sommelier Rick Anson: o "carro do deslumbrado") até Moema ou Itaim, e prefere pagar mais caro, se estressar no trânsito, ganhar um token de fila de espera, deixar o carro com o manobrista, porque dessa forma ele vê e é visto, se destaca no meio dos amigos falando que frequenta esse e aquele lugar em SP.
Enquanto a visão provinciana que domina grande parte da população da região e a imbecilização do povo, que tem preguiça de pesquisar locais diferentes e arriscar coisas novas pelo ABC, o mundo da gastronomia nas 3 cidades vai sempre ficar refém das grandes praças de alimentação dos shoppings e dos restaurantes que se vangloriam de serem "premiados" por uma revista que nunca sai do óbvio (por motivo$ que é melhor não comentar).
      Sabemos o quanto é complicado, gerir um negócio, ainda mais neste ramo, e para este público, mas ao mesmo tempo é gratificante. E ,no fim das contas, quem arriscaria ter um restaurante, café, pizzaria, ou outros, com um algum conceito diferente que dá tão certo em SP, aqui na região? Ninguém gosta de rasgar dinheiro, e por isso as opções nunca surgem. Os poucos loucos e apaixonados pelo que fazem que se arriscam, deveriam ter uma estátua em praça pública só pela iniciativa. Um círculo vicioso que nunca se rompe: não abrir algo diferente por não ter clientes pelos motivos acima, mas ao mesmo tempo, não se arriscar em um novo negócio faz com que essa cultura nunca mude. Em tempos de cebolas gigantes e chefs que gostam de servir arroz com feijão por quase R$ 100,00 por pessoa, abrir os olhos do povo parece algo impossível, e exatamente por isso temos de reverenciar os que tentaram, e ainda tentam. Obrigado Valter (e a todos os outros citados, entre vários outros locais que já fecharam ou estão em via de baixar as portas por conta do baixo movimento) por ter insistido em sair da mesmice com suas idéias diferentes, serviço impecável e cardápio excelente. Torcemos por um mundo (na verdade, um ABC) com mais Madalenas e menos Outbacks e Jettas Brancos.